Como andaram as políticas de C&T, saúde e meio ambiente durante o recesso de julho no Congresso

Entre os destaques: Brasil fecha suas metas com a OMS até 2027, e o estado do Mato Grosso tenta flexibilizar a Lei do Pantanal para liberar áreas de proteção permanente para a pecuária.

Arte: Daniel Liberatore de Lima

Caro leitor: entre 18 e 31 de julho não houve trâmites no Congresso. Os parlamentares estão em recesso, conforme consta no art. 57 da Constituição Federal. Aproveitamos a folga para separar alguns projetos de lei que não foram citados anteriormente e já estavam tramitando antes do dia 18 – bem como acontecimentos relevantes nas demais esferas do poder ou em outros níveis de governo.

Saúde

No dia 18 de julho, o Brasil e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) – nome do escritório regional da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas – estabeleceram a Estratégia de Cooperação com o País (ECP) entre 2022 e 2027, um instrumento utilizado para orientar o trabalho da OMS em cada país-membro.

A ECP se adapta às necessidades de cada Estado atendido e orienta políticas públicas no âmbito da saúde, auxiliando no planejamento, gestão e melhor alocação dos recursos a fim de atingir os fins propostos.

Na ECP brasileira, as estratégias foram elaboradas pela OMS em parceria com o Ministério da Saúde (MS), o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) e o Conselho Nacional de Saúde (CNS).

O documento delimita cinco áreas prioritárias: proteger e promover a saúde da população, com foco em pessoas em situação de vulnerabilidade; recuperar e melhorar os serviços de saúde e os programas prioritários impactados pela pandemia de covid-19; contribuir com o desenvolvimento do SUS, conforme as necessidades de saúde da população; impulsionar o desenvolvimento científico e tecnológico em saúde; reforçar a prevenção de situações de calamidade e melhor a capacidade de reagir a elas, com a participação das comunidades afetadas.

Outro assunto importante do recesso foi a transparência das finanças públicas em saúde. Com o objetivo de modernizar os bancos de dados das secretarias de saúde estaduais e municipais, o Ministério da Saúde disponibilizou uma nova versão do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS), que já pode ser preenchida com dados do primeiro bimestre de 2022.

Esse banco registra as despesas e receitas do SUS nos três níveis de governo. Ele permite verificar como os recursos são aplicados e quais repasses devem ser feitos pela esfera federal.

Também no Executivo, a Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos estratégicos em Saúde, por meio da portaria n° 68, de 18 de julho de 2022, decidiu por não incorporar ao SUS os anticorpos monoclonais anti-EGFR e anti-VEGF, usados para tratamento de câncer colorretal metastático em estágio avançado.

Nossas células de defesa produzem proteínas complexas chamadas anticorpos. Cada linfócito tem um DNA ligeiramente diferente, que o torna capaz de produzir um anticorpo com um encaixe exato para aderir a um determinado antígeno (nome genérico para qualquer coisa estranha) que adentra o corpo. Como as proteínas spike do coronavírus, por exemplo.

Essa capacidade de encaixe permite que os farmacêuticos usem anticorpos customizados com várias finalidades, que não tem a ver com grudar em antígenos. Por exemplo: existem anticorpos talhados para se encaixar em um receptor (uma espécie de botão) na superfície das células de defesa, com o objetivo de acordá-las para combater um tumor. É a chamada imunoterapia.

Como esses anticorpos precisam ser todos idênticos, de modo a acionarem todos o mesmo botão, eles precisam ser fabricados em massa a partir de um único anticorpo matriz (daí o nome “monoclonal”: são todos clones de uma única molécula original).

A fabricação desses remédios ultratecnológicos é bastante cara, e os resultados nem sempre são promissores. A decisão de incorporar algo assim ao SUS depende de critérios como eficácia, efetividade, segurança, análise de custo-benefício e o monitoramento do horizonte tecnológico.

Em linhas gerais: se o custo de um tratamento inovador for muito mais alto que o de suas alternativas, mas o benefício oferecido aos pacientes não for proporcional, as autoridades podem optar por não incorporá-lo ao SUS. Foi o que aconteceu com esses dois anticorpos.

Meio ambiente

Outra notícia é o decreto presidencial n° 11.141, de 21 de julho de 2022, que altera um trecho do decreto n° 9.888, de 27 de junho de 2019

O resumo da opera é o seguinte: as distribuidoras de combustíveis fósseis (Ipiranga, Shell etc.) precisam cumprir metas anuais de redução de gases de efeito estufa.

Normalmente, elas precisariam entregar a documentação que comprova a meta até 31 de março de 2022. Agora, com a modificação do decreto, elas poderão apresentar a papelada até 30 de setembro de 2023. 

Uma das explicações para essa folga no prazo é que as distribuidoras não estão conseguindo comprar créditos de descarbonização suficientes na bolsa de valores de São Paulo, a B3 (cada crédito comprado pelas distribuidoras compensa uma tonelada de dióxido de carbono emitido na atmosfera).

A baixa oferta tem a ver com o fato de que os vendedores desses créditos (empresas que geram um saldo de poluição atmosférica positivo, que compensa as emissões de outras) não têm obrigatoriedade de oferecê-los.

No âmbito estadual, a Assembleia Legislativa do Mato Grosso, por meio da Comissão de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Recursos Minerais, propôs uma nova política de gestão para a Bacia do Alto do Paraguai, a rede hidrográfica que compreende o Pantanal e diversos rios importantes, como o Paraguai e o Paraná (projeto de lei estadual 561/2022).

Com ela, haveria uma flexibilização da Lei do Pantanal (8830/2008) e áreas de proteção permanente seriam liberadas para uso.

Dentre as atividades permitidas estão a pecuária extensiva, o ecoturismo e o turismo rural. As comunidades locais denunciaram a ausência de estudos que comprovem os impactos à região.

A proposição veio pela primeira vez a plenário em 1 de junho de 2022 e, após passar por emendas, votação e aprovação da redação final, está à espera da sanção governamental desde 14 de julho. 

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